GLAUCO DINIZ DUARTE – Diagnóstico de falhas em turbocompressores
Diagnóstico de falhas em turbocompressores. O turbocompressor é uma peça bastante familiar para o mecânico que mexe com veículos pesados. Sua aplicação nos motores diesel visa o aumento de potência, dispensando um bloco ainda maior para empurrar o bruto, já que um motor menor e turbinado gasta menos combustível e, consequentemente, emite menos poluentes.
Quem garante os benefícios é André Mitsumori, engenheiro de aplicação da Honeywell, fabricante dos turbos Garrett, ele faz a comparação entre um motor V8 de 6 litros, naturalmente aspirado, que pesa 295 kg e desenvolve 165 kw de potência (aproximadamente 221 cv), contra um motor turboalimentado de 2.5 litros e 4 cilindros, que pesa 114 kg e desenvolve exatamente a mesma força. “Temos dados de motores a diesel onde o consumo de combustível no motor aspirado cresce em função da potência, o que não ocorre no motor turbinado, já que o benefício que o turbo traz é a diminuição do tamanho e do peso do motor”, explica André.
O propósito do turbo é fornecer mais ar para o motor, permitindo a queima de mais combustível, assim produzindo mais potência. “A mistura ar/combustivel é mantida dentro dos parâmetros para a geração de mais potência. No ciclo Otto, esse controle é feito através da sonda lambda, onde temos uma mistura mais homogênea. Já no ciclo diesel, a mistura trabalha com excesso de ar”, detalha o engenheiro.
Ao contrário do que muitos pensam, os gases de escape não são reaproveitados na admissão do cilindro. Os gases de escape servem para girar o rotor da turbina (carcaça quente) que, através de um eixo (localizado na carcaça central), gira o rotor do compressor (carcaça fria), que comprime o ar atmosférico e o envia para a admissão do cilindro, criando uma pressão positiva sobre o pistão e aumentando a mistura ar/combustível.
“Não há nenhum contato entre os gases que saem para o escapamento e o ar que é comprimido para a combustão. Os gases de escape são descarregados pelo sistema de exaustão para a atmosfera”, esclarece.
Apesar de ser um elemento comum no dia a dia de uma oficina diesel, muitas vezes, alguns problemas no pesado são associados ao turbo, sem que esta peça seja a culpada direta. Antes de julgar, o mecânico deve observar se estão em ordem: mangueiras, abraçadeiras, filtros de ar (primário e secundário), regulagem de válvulas, sistema de injeção, juntas e conexões. Outras vezes, quando o turbo realmente é o problema, o dano acontece principalmente por falta de manutenção preventiva – que nada tem de especial além dos cuidados básicos com o bom funcionamento dos caminhões ou ônibus.
Entre as práticas que podem danificar o componente, o engenheiro elege como principal a negligência da manutenção do óleo do motor. “Óleo contaminado e a falta de óleo são os campeões de reclamação na Garrett”, garante André. Como o turbo trabalha em rotações que chegam até a 190 mil rpm e atinge temperaturas de até 840ºC, a sua correta lubrificação é crucial para que ele trabalhe em condições ideais. A falta de manutenção de itens como filtros de óleo, ar e combustível também afeta diretamente o funcionamento da peça e causa problemas de lubrificação, entre outros que veremos a seguir.
Insuficiência de óleo
O engenheiro explica que, quando não é utilizado o óleo com a especificação correta, ou quando não é feita a troca do óleo e dos filtros nos períodos indicados pelo fabricante, o aumento de temperatura dentro do turbo pode queimar o restante do óleo que fica no eixo, (A) além de causar formação de borra de carvão. (B) “Essa formação de borra poderá vir a bloquear a passagem de óleo no sistema de mancais e na carcaça central, onde a falta de lubrificação poderá deteriorar o eixo e o sistema de mancais, assim como os componentes do motor também, já que o óleo lubrificante é o mesmo”, assegura o engenheiro.
Para identificar se o turbo esteve rodando sem lubrificação, observe se o eixo está azulado e se os mancais estão danificados, o que causa vazamento de óleo. O excesso de temperatura dentro da carcaça central ainda pode provocar a formação de borra dentro da câmara da carcaça central ou a perda das propriedades mecânicas do anel elástico de vedação.
Para evitar a falta de óleo no turbo, além de verificar o nível de lubrificante no cárter, também deve ser observado se há vazamentos de óleo no turbo, verificando a saída de ar na carcaça do compressor, procurando por alguma evidência de óleo lubrificante. Além disso, também observe se a temperatura de saída dos gases está correta ou se há obstrução nas tubulações e canais de lubrificação da carcaça central.
Óleo contaminado
Quando o óleo do motor é apenas completado ao invés de ser totalmente trocado, o filtro geralmente não é substituído como tal. Assim, o óleo irá acumular impurezas sólidas, não mais retidas pelo filtro de óleo e de ar, além de perder viscosidade devido ao combustível e à deterioração química natural dos seus aditivos. As impurezas do óleo podem entupir as câmaras de lubrificação da carcaça central do turbo, assim como os canais de lubrificação do mancal radial, do colar e de outros componentes, formando borra. (C) A consequência é a alta temperatura e o desgaste precoce dos mancais e do eixo.
Um fator de contaminação que André destaca é o uso de cola nas juntas de vedação de entrada e saída de óleo do turbo. “Não deve ser utilizada cola nessas juntas. A junta que é fornecida pela fabricante e pelos distribuidores credenciados pela fabricante já vêm na especificação correta para que seja montada sem a utilização de cola”, adverte. Devido às altas temperaturas de trabalho do turbo, a cola gera resíduos que entram pelas galerias, criando impurezas que são levadas pelo óleo para dentro do turbo. A contaminação do óleo também pode vir de motores recondicionados com impurezas nas galerias de óleo.
De acordo com o engenheiro, não há nenhum tipo de óleo especial para motores turbinados. “O mesmo cuidado que deve ser tomado com o óleo de qualquer motor vale para o motor turbinado, ou seja: troca de óleo no período indicado pelo fabricante, utilizar o óleo de especificação correta e nunca completar o óleo, mas, sim, trocá-lo por completo”, enfatiza André.
Os sintomas mais marcantes das falhas decorrentes da má lubrificação são ruído, perda de potência, excesso de fumaça, consumo excessivo de óleo e o vazamento do próprio óleo – por mais paradoxal que pareça. “A falta lubrificante poderá danificar os componentes internos, alterando suas dimensões. Em condições onde a pressão nas carcaças terminais é menor do que a pressão na carcaça central, pode fazer com que o lubrificante vaze pelo sistema de vedação, que teve suas dimensões alteradas. Este fato pode ser evidenciado ao se verificar a saída de ar comprimido na carcaça do compressor”, garante André.
A falta de lubrificação irá aumentar o contato entre os metais; no caso, anel de vedação, eixo e carcaça central. “Por isso, orientamos o amigo mecânico a recomendar para o seu cliente que execute o que o manual do proprietário do veículo recomenda: a troca dos filtros e do óleo no período correto. Uma economia de alguns reais agora podem gerar um gasto de muitos reais lá na frente”, avisa.
Parada quente
Em qualquer motor turbinado, após ser ligado ou antes de ser desligado, é necessário que seja mantido em funcionamento por um tempo entre 30 e 50 segundos. O período em marcha lenta é necessário para que o óleo chegue até o turbo, favorecendo a estabilização da pressão nos mancais. Se o caminhão rodar imediatamente após a partida, o turbo pode começar a operar com pouco óleo, causando danos por superaquecimento devido à insuficiência de óleo. (D)
Já quando o veículo está para ser desligado, o tempo de espera serve para que a rotação do turbo diminua. Aquela famosa acelerada antes de desligar o motor? Nem pensar. “Se esta recomendação não for seguida, teremos excesso de óleo lubrificante no conjunto rotativo. Combinado com a alta temperatura do turbo, pode fazer com que este excesso de óleo lubrificante queime o eixo e o sistema de mancais”, analisa André.
Esforço axial
Quando existe uma obstrução na saída de gases de escape, ou na entrada de admissão de ar do turbo, o problema provoca um esforço axial em cima dos mancais, tanto os radiais quanto os de encosto. A consequência é um desgaste prematuro dos componentes internos, gerando vazamento de óleo interno e aumento no consumo de combustível devido à contaminação do ar de admissão. A contaminação do ar de admissão irá fornecer um ar comprimido com vestígio de óleo lubrificante, alterando a mistura ar/combustível”, argumenta André. Ainda, se o sistema de exaustão não for igual ao original, ou não seguir as especificações recomendadas pela montadora, também pode causar problema de esforço axial no turbo, caso o sistema provoque contrapressão maior que a prevista no projeto original do motor.
Ingestão de objeto estranho
A ingestão de objeto estranho pode ocorrer tanto do lado do compressor quanto do lado da turbina, na admissão dos gases de escape. O objeto pode ser desde uma peça grande até uma partícula de junta do coletor. “O objeto estranho pode vir de um filtro que não foi substituído no período correto, que pode emitir uma partícula que entra pelo lado do compressor e danifica as pás do rotor de compressão – em alguns casos, chegando até a quebrar as pás do rotor”, garante André. (E)
Por isso, o engenheiro recomenda que, quando houver alguma manutenção nos coletores, é importante verificar se não sobrou nenhum resíduo de junta, arruela, parafuso ou qualquer outro metal. Qualquer corpo estranho que esteja nas tubulações, tanto de admissão do compressor quanto na admissão do escape, pode provocar danos sérios aos rotores do turbo. Danos ou ressecamento das mangueiras de ar também podem ser as causas do lado do compressor.
Turbo violado
A válvula wastegate é uma válvula de alívio para a turbina. Em uma determinada pressão, que é lida na saída do compressor, a válvula wastegate abre, liberando o gás que está em excesso na turbina. A válvula sai da fabricante com algumas marcações no atuador, que são seus limites de trabalho.(F) Se a peça for modificada com o intuito de o turbo trabalhar acima do seu limite, em busca de mais desempenho, a garantia é perdida. “Quando a regulagem do atuador é alterada para se conseguir uma melhor performance, como consequência, vai ocorrer o superaquecimento tanto da carcaça central quanto na carcaça de turbina, além do aumento de rotação, o que vai danificar a peça e diminuir a sua vida útil”, avisa André, que também alerta para os danos que podem ocorrer dentro do motor.
Turbos remanufaturados não são turbos recondicionados!
André explica que a Garrett disponibiliza no mercado três produtos: o turbo novo, o conjunto rotativo e o turbo remanufaturado. “O turbo remanufaturado é um conjunto usado no qual são identificadas as peças que podem ser reutilizadas e é feita uma remontagem pelo próprio fabricante na mesma linha de produção onde é montado o turbo novo. Então, ele é um turbo totalmente balanceado, totalmente confiável”, garante o engenheiro, que enfatiza as diferenças entre uma peça remanufaturada e uma recondicionada. (G)
“O turbo remanufaturado atinge a mesma vida útil, redução de consumo e diminuição de emissão de poluentes de um turbo novo. O turbo recondicionado, por não ter procedência confiável, causa aumento de consumo de combustível, aumento na emissão de poluentes e diminui a potência do motor, além de ter uma vida útil infinitamente menor”, alega. Conforme dados de teste colhidos pela Garrett, os turbos recondicionados fazem o caminhão consumir 5% a mais de combustível e têm vida útil de, no máximo, 50 mil km, enquanto tanto a peça nova quanto a remanufaturada são projetadas para rodar 300 mil km. “O produto remanufaturado só pode ser feito por quem o produz, ou seja, o turbo remanufaturado da Garrett, só pode ser feito pela própria Garrett”, sublinha André, que alerta para o mau uso da marca, que já registrou casos de pirataria com seu nome no mercado.
O que vem por aí
Novas tecnologias que já são aplicadas em turbocompressores no exterior devem chegar ao Brasil em breve. Como exemplo, André cita o turbo que equipa a picape Ford 450 nos Estados Unidos, que aplica diversas novidades, como o sistema de rolamentos no eixo (H) (substituindo os mancais radiais e axiais), o atuador eletrônico, que dentro do sistema de geometria variável (I) permite que o turbo trabalhe de forma mais precisa, e o rotor de compressão duplo, (J) chamado de dual boost, que aumenta a força do turbo em até 30%. Em turbos com aplicação em caminhões Euro V, ainda há o rotor de compressão fresado, que possui vida útil cinco vezes maior do que os rotores comuns.